A Câmara Municipal de Tomar, uma vez mais, não divulgou o projeto de calcetamento do Parque do Mouchão, tendo este sido publicado no portal BASE1 no dia 26 de maio de 2025.
Se se reparar no título desta empreitada, nota-se logo que diz respeito a arruamentos (plural) e não a um único arruamento, a via central do Mouchão. Isto é contrário ao que foi anunciado pelo Senhor Presidente da Câmara, quer publicamente, quer em reunião de Câmara.
No entanto, a peça desenhada que acompanha o procedimento mostra claramente que vai haver calcetamento de uma via lateral e de uma parte na entrada do Mouchão. Com que objetivo? Não se sabe. Será que se pretende instalar mais áreas de estacionamento para servir os interesses privados da Estalagem? É que a estalagem, depois da remodelação e reabertura, tem agora mais quartos, mas o número de estacionamentos na área concessionada manteve-se e alguns hóspedes comentam o acesso e estacionamento nas suas avaliações 2.
De resto, das peças do procedimento, são poucas as coisas que se conseguem perceber porque, mais uma vez, a falta de rigor e detalhe deste projeto é gritante:
– memória descritiva – não está sequer assinada e entra em contradição com a peça desenhada, uma vez que refere:
“foi entendido proceder à pavimentação do arruamento central no mesmo tipo de material, fechando a malha viária entre a ponte rodoviária e a estalagem, numa área de 690,00 m2”
A memória também refere que:
“será necessário proceder à abertura de caixa com cerca de 15 cm de espessura, cujas terras deverão ser retiradas e transportadas para vazadouro autorizado.”
Onde e como é feita a abertura de caixa? Não se sabe. Não consta da memória descritiva nem da peça desenhada.
Sobre as espécies arbóreas aí existentes, a memória descritiva diz:
“Considerando a existência de árvores de grande porte (plátanos) a ladear o arruamento central do parque, e de modo a conservar e proteger as suas raízes, a cota do arruamento será elevado cerva de 10 cm, o que facilitará igualmente o escoamento das águas pluviais das valetas laterais.”
Não se refere os cuidados que se deve ter com as espécies arbóreas existentes no Mouchão, em particular com os plátanos, e nem há referência ao Guia de Boas Práticas para a Gestão do Arvoredo Urbano. Este guia é bastante recente (primeira edição de outubro de 2024, assinatura da Ministra de março de 2025), mas a data da memória descritiva é abril de 2025.
Tendo em conta o “ruído” criado pelas olaias da Av. Dr. Egas Moniz, seria de esperar que as boas práticas vertidas neste guia constassem desta e de futuras empreitadas onde há espécies arbóreos.
O guia é muito claro: “Qualquer obra (ex. abertura de valas, reparação ou reperfilamento de pavimentos, armazenamento de equipamentos ou materiais, tráfego de pequenos veículos ou pessoas) que decorra nas imediações de uma árvore, à superfície ou no subsolo, constitui uma ameaça para a sua vitalidade, sanidade, estabilidade mecânica e, eventualmente, sobrevivência.”
– peça desenhada – da autoria de António Garrucho, data de 23 de abril de 2025, não tem escala e não tem legenda. Não há levantamento topográfico, nem estão assinalados os plátanos e outras espécies arbóreas. Não há cotas de terreno, condutas e outros elementos que até podem ser importantes.
– caderno de encargos – um documento tipo adaptado a esta empreitada.
– mapa de trabalhos/ lista – uma descrição dos trabalhos. A partir daqui percebe-se que a caixa tem a área dos arruamentos e que os produtos escavados vão para vazadouro autorizado (será para aterro?). Também é referido que há um traço de cimento para o fecho das juntas (a calçada é coberta com uma mistura de areia e cimento).
– foto do arruamento central do Mouchão – para quem não esteja familiarizado com o Parque do Mouchão, não percebe de onde é tirada a fotografia. Se prestar atenção vê a “nora” ao fundo assinalada na peça desenhada e percebe que o edifício deverá estar atrás.
Sendo o Parque do Mouchão um parque público e parte da Estrutura Ecológica Municipal Estratégica, merecia um projeto mais completo e rigoroso, com um estudo de integração na paisagem, tendo em consideração as componentes ecológicas, visuais e sociais daquela Estrutura, conforme obrigatório pelo Plano Diretor Municipal. Merecia a sua divulgação pública e o envolvimento da população. Mas, tal como na instalação do palco, que também poderá dar uma boa esplanada se a estalagem abrir o quiosque para o explorar como café, a Câmara parece estar mais preocupada com os interesses privados e com os turistas do que com quem vive em Tomar.
O Mouchão é muito mais do que um parque; é um símbolo da cidade de Tomar amado pelos Tomarenses.
Se a Câmara Municipal de Tomar está atenta aos ventos de mudança e sabe que o paradigma do turismo está a mudar, por que não promover o turismo da natureza e observação de aves e outras espécies proporcionado pelo Parque do Mouchão e pelo rio Nabão, defendendo a sua preservação e valorização ambiental?
Joana Simões
Licenciada em Engenharia do Ambiente pelo InsTtuto Superior Técnico
Mestre em Bioenergia pela FCT/UNL
Doutoranda em Ciências da Sustentabilidade na Universidade de Lisboa