Tomar e a sua Judaria, por Santos Simões

Por: Beja Santos

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Santos Simões

Numa edição do Museu Luso-Hebraico (Museu Abraão Zacuto), João Miguel dos Santos Simões, seu Diretor-Conservador, deu à estampa em 1943 um significativo trabalho sobre a Judaria tomarense e a sua Sinagoga. O engenheiro Samuel Schwarz, que adquirira o edifício da Sinagoga e o oferecera ao Estado, que o classificou como Monumento Nacional, escreve no prefácio que o primeiro monumento hebraico referente a Tomar de que tivera conhecimento fora a lápide funerária, do início do século XIV, encontrada em Faro, no lugar do Espaldão, e que depois fora depositada no cemitério judaico da cidade algarvia. Tal lápide referia o Rabi Joseph de Tomar. Datava de janeiro de 1315 da era cristã. O engenheiro Schwarz refere que o segundo monumento judaico de Tomar de que se ocupara era a Sinagoga que adquirira em 1923 e doara ao Estado em 1939.

É o único testemunho que nos resta em Portugal de um edifício completo, tendo servido de templo hebraico, anterior à expulsão e conversão à força dos judeus. A Judaria de Tomar nunca desapareceu da tradição oral, ficou sempre ligada ao nome da Rua Nova. O engenheiro Schwarz comprou o edifício da Sinagoga que era ao tempo um armazém de mercearia. Em 1925 publicava-se o primeiro estudo sobre a Sinagoga, foi seu autor o investigador Coronel Garcês Teixeira. Em 1943, o Estado nomeava uma Comissão Orientadora dos Trabalhos da Organização do Museu Luso-Hebraico de Tomar, entre eles Garcez Teixeira, Samuel Schwarz e Moisés Amzalak.

O período áureo da presença judaica em Tomar, dizem os estudiosos, corresponde ao desenvolvimento imprimido pelo Infante D. Henrique. Santos Simões dá-nos uma curiosidade quando fala das obras de saneamento e drenagem das águas, as condições sanitárias de Tomar eram muito precárias e Gil Vicente, na tragicomédia “Triunfo do Inverno” faz-lhes uma alusão:

“Sabeis pera que elle he bô?

Pera bichas e serpentes

E fazer suar as gentes

E encher barbas de po,

E de febres Alemtejo

E de maleitas Thomar.”

É graças ao Infante que se vai delinear a Tomar histórica, praça, igreja principal, boticas e açougues, distribuição da população, o seu agrupamento por bairros e ruas. Foi este desenvolvimento urbano que atraiu uma colónia judaica. Continuamos a seguir Santos Simões.

O estabelecimento dos judeus em Portugal só começa a ter valor histórico no século XIV, aumentando progressivamente a sua importância até atingir o ponto culminante no terceiro quartel do século XV, durante o reinado de D. Afonso V, haverá já declínio no reinado de D. João II. Os judeus terão permanecido em Tomar como cristãos-novos, e receberão privilégios manuelinos.

Com a instalação do Santo Ofício no Convento de Cristo, haverá um profundo abalo na vida da Judaria. Diz Santos Simões que em dois autos de fé que se realizaram em Tomar em 1543 e 1544 (aliás os únicos que tiveram lugar na vila) figuravam sete antigos judeus. A atividade do Santo Ofício continuou por largos anos, foram apresentadas denúncias referentes a cristãos-novos de “judaizarem”. A Judaria deu lugar à Rua Novo, hoje Rua Dr. Joaquim Jacinto. A esnoga – termo ainda hoje usado no Algarve e nome de uma velha rua do Porto – foi comprada expressamente para servir de cadeia de homens – a prisão de homens era no Templo e a das mulheres numa dependência anexa. Dos princípios do século XVII foi encontrada documentação que revela a nova aplicação dada à velha Sinagoga depois de ter servido de cadeia: a Ermida de S. Bartolomeu. E Santos Simões fala de um portal que bem poderia ter sido de uma capela, mas ele julgava que a ermida funcionou na antiga cadeia porque ficou a tradição de que estava ligada a uma capela.

O estudioso descreve o interior da Sinagoga, o seu aspeto orientalizante de planta aclarada que lembra as pequenas mesquitas do Magreb ou as pequenas edículas bizantinas, refere as altas colunas que continuam, acima dos capitéis, por plintos de onde arrancam as arestas das abóbadas. Refere as pesquisas do engenheiro Schwarz, caso das oito bilhas de barro alveoladas nas paredes. Teriam sido quebradas por operários que ali teriam procurado um tesouro escondido. “Com a suspensão dos trabalhos do engenheiro Schwarz ficaram os alvéolos de algumas bilhas à vista. Recentemente foi possível mandar reproduzir as que haviam desaparecido ou estavam desfeitas, e nos quatro cantos voltaram a colocar-se todas as bilhas, aproveitando-se exatamente os mesmos alvéolos e ficando na primitiva posição.

Em jeito de conclusão, o engenheiro Santos Simões retoma a ideia de que a Judiaria de Tomar datará, com muita probabilidade, de entre 1430 e 1460. “É joia do maior valor artístico e arqueológico, a velha Sinagoga desafia o tempo com aquela altivez e resignação dos velhos Rabis que lhe deram vida”.

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1 comentário
  1. joao schwarz Diz

    O engenheiro Samuel Schwarz não se chamava Samuel SCHAWARZ.

    Queira ter a bondade de corrigir o nome.

    Cordialmente

    Joao Schwarz

Responder a joao schwarz
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