Tomar, a cidade e os seus monumentos, aos olhos do coronel Garcez Teixeira, em 1935

Por: Mário Beja Santos

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A editora chamava-se Neogravura, tinha um projeto ambicioso em revelar tesouros artísticos um pouco por todo o Portugal, era um plano de publicação de álbuns que começava em Lisboa e arredores e descia até ao Alentejo. O álbum sobre Tomar foi publicado em 1935, o seu autor foi o coronel de Engenharia Francisco Augusto Garcez Teixeira, nascido em Lisboa, mas devotadíssimo a Tomar, legou-lhe um conjunto de obras que merecessem ser revistas. Foi arqueólogo, publicista, investigador documentado e tinha uma escrita bem agradável, veja-se o arranque do texto deste álbum: “Entre a variadíssima paisagem que se estende do Minho ao Algarve, a região onde se encontra Tomar tem, incontestavelmente, um lugar proeminente.

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Vista panorâmica do Castelo dos Templários

Acidentada sem exagero, atravessada por um rio que, mercê do seu regime especial, proveniente de ser alimentado em grande parte pela nascente do Agroal, constante e abundantíssima, cortado por numerosos açudes donde a água é levantada por pitorescas rodas, nela brota uma vegetação abundante e variada, que vai desde a útil oliveira até ao plangente salgueiro e à perfumada roseira.” Fará afirmações que seguramente serão contestadas por estudiosos de hoje, dirá, por exemplo, que o castelo assenta nos destroços de Sellium ou que os panos das velhas muralhas não oferecem interesse maior sob o ponto de vista artístico.

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O coro da igreja do Convento de Cristo
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Pormenor do claustro de D. João III e a fonte de Fernão Torres

Enfatiza, o que é compreensível, a Charola chamando-lhe oratório, construção octogonal de rasgados arcos levemente quebrados, anunciando a ogiva gótica. Exalta as mudanças operadas no Renascimento, os ornamentos pictóricos e deplora os imperfeitos restauros que sofreram. “Nas faces da Charola foram colocados doze grandes painéis de pintura a óleo, excelentes trabalhos quinhentistas, dos quais apenas quatro estão nos primitivos lugares, além de dois retábulos dos altares laterais ultimamente ali colocados.”

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O açude do Nabão e a Avenida Marquês de Tomar
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A ponte velha e o convento de Santa Iria

Havia, então, o Museu da União dos Amigos dos Monumentos da Ordem de Cristo, onde se acolhiam fragmentos de três desses painéis. E prossegue a sua viagem pelo claustro do cemitério, refere as obras executadas no tempo de D. Manuel e dos Filipes, a sua descrição centra-se agora nas obras de D. Manuel I, não esconde o seu assombro pela obra do coro e lastima a inacabada Casa do Capítulo, ruínas que foram aproveitadas pela União dos Amigos dos Monumentos da Ordem de Cristo que ali organizou um museu lapidar. Irá percorrer os diferentes claustros, deixará uma referência à enfermaria e à botica, nesse ano de 1935 estava ali instalado o hospital militar.

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Paços do Concelho
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Interior da Ermida de Nossa Senhora da Conceição

Não esconde o seu assombro pela Ermida de Nossa Senhora da Conceição, trata-a como joia arquitetónica do Renascimento de toda a Península, o seu entusiasmo é tal que desce aos pormenores: “Interiormente, a sua forma é a das basílicas romanas: uma nave central e duas laterais, separadas por duas filas de três colunas, com primorosos capitéis, sem cruzeiro, ousia com dois compartimentos laterais limitados pelas paredes dos topos das naves laterais.
Robustas arquitraves coroam as duas filas de colunas servindo de apoio a uma abóbada de berço, de aduelas almofadadas, que corre ao longo da nave central, e dois outros berços, de mais simples ornamentação, que cobrem as naves laterais, vindo apoiar-se na cimalha da parede.”

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Aqueduto de Pegões

Estamos agora na Igreja de S. João Baptista, exalta a fachada, trata-a como um dos mais elegantes exemplares do gótico tardio, elogia o elegante campanário: “É constituído por um primeiro corpo prismático, de base quadrada, sobre o qual assenta um outro de secção octogonal, em cada uma de cujas faces se abre uma sineira ogival. Este corpo é rematado por uma elegante balaustrada, acima da qual se ergue a alta cúpula piramidal de tijolo, com uma dupla cinta.”

Não esquece de tecer os maiores encómios aos quadros de Gregório Lopes, bem como ao belíssimo tríptico do batistério. Estamos agora chegados a Santa Maria do Olival, assentará porventura sobre ruínas de um mosteiro beneditino, construção no estilo de transição do românico para o ogival. “A sua porta lateral, meio soterrada, é de arco pleno, de ornamentação muito rudimentar, enquanto que na porta principal se vê já a primitiva ogiva, de tríplice arquivolta e ornamentação de ressaibo românico, encimada pelo Signo de Salomão, emblema usado pelos Templários.

A enorme rosácea que conserva ainda a sua grilhagem de pedra, ilumina a nave central. Duas janelas amaineladas de arco trilobado, dão luz às laterais. A impressão geral da fachada, apesar do aterro exterior que a encobre em parte, é ainda assim de uma sóbria majestade.”10 1E toda esta viagem culmina no novo posto de turismo que estava em construção em fase adiantada, diz ele um edifício na Rua da Graça. “A Comissão do Turismo teve a feliz inspiração de aproveitar diversos elementos arquitetónicos da Renascença Joanina, provenientes da demolição de prédios quinhentistas. A formosa janela do ângulo da capela da Casa do D. Prior, uma janela de peitoril e um duplo portal retirados de uma construção da Rua Direita, outra de balaustrada, de uma casa da Rua da Palmeira, e o portão do edifício de Cubos, além de outros elementos, dão à moderna construção um elegante aspeto, tornando-a como que uma síntese da cidade quinhentista, que o progresso, e sobretudo o meu gosto, têm descaracterizado.”

11Vale a pena folhear este álbum que caminha para os 90 anos, ver cuidadosamente estas imagens e compará-las com a cidade que hoje usufruímos. E há que ter em conta que o coronel Garcez Teixeira escreveu muito sobre Tomar, há que desencantar o que escreveu e aqui relembrar.

Mário Beja Santos

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