O Conde de Tomar estudado como orador parlamentar

Por Mário Beja Santos

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f56António Bernardo da Costa Cabral, Traços de oratória em diálogo com os seus pares, por Isabel Banond, Assembleia da República, 2015, é uma investigação que se irá centrar sobre os discursos, réplicas e polémica tomadas de posição por aquele que, porventura, terá sido o mais polémico, amado e detestado político do liberalismo, antes da Regeneração. Alguns dados curriculares são abonados pela investigadora. Costa Cabral nasce em 1803 em Fornos de Algodres, falece na Foz do Douro em 1889.

O seu irmão mais velho é José Bernardo da Silva Cabral, altamente envolvido na política liberal (eram tratados como os manos Cabrais), prosseguiram juntos até ao corte de relações, que se deu no segundo mandato político de Costa Cabral, quando regressou de Madrid e será apeado pelo Duque de Saldanha. Nasceu no seio de uma família de tendências genuinamente liberais e maçónicas. Bacharel em Cânones pela Universidade de Coimbra e formatura em Direito em 1823. Exerceu a advocacia e magistratura.

Membro do Grande Oriente Lusitano, atingiu o 33º grau e foi eleito Grão-Mestre como irmão Fénelon, após disputa com Rodrigo da Fonseca, frequentou a loja União. Uma parte considerável das revoltas havidas contra o cabralismo tiveram origens maçónicas mesmo nas cisões maçónicas em que os Cabrais aparecem envolvidos.

Foi um dos maiores defensores da Carta Constitucional de 1826, responsável máximo pela sua restauração em 1842. Cabral situava-se na extrema-direita do leque liberal. Atenda-se à envolvente internacional em que se irá instaurar o seu poder político. Fundara-se uma Santa Aliança dos Povos contra a Santa Aliança dos Reis, o que veio favorecer o liberalismo em Portugal mesmo que a causa miguelista tivesse sérios apoios. Cabral tinha um vasto campo de hostilidades que se estendia desde os setembristas e cartistas até os não cabralistas e miguelistas. Liberal assumido, Costa Cabral exilou-se durante o miguelismo, logo em 1828.

A revolução que estoirou em 9 de setembro de 1836 incorpora a ideia que a Constituição a elaborar deveria respeitar o princípio da soberania popular, era por isso que a Carta de 1826 não servia; a Câmara dos Pares deveria ser abolida; era esta a posição de Passos Manuel que acabou por vingar, em completa oposição a Costa Cabral. É neste cenário que se irá dar a Belenzada (1837), golpe palaciano patrocinado pela rainha e pelo príncipe consorte.

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O Conde de Tomar na velhice

Inicia-se o percurso político do 1º Conde de Tomar. Administrador geral interino do distrito de Lisboa, esmagou a insurreição da Guarda Nacional. Não esconde a sua simpatia pelo cartismo, e ocupa em 1939 a pasta de Ministro da Justiça e dos Negócios Eclesiásticos. Com a queda do governo setembrista de Sá da Bandeira, Costa Cabral entra no novo executivo.

Os grandes ataques ao político aparecem nos cafés, no parlamento, nos jornais: “Conde de Tomar sois um concussionário porque entraste para o poder pobre e tendes adquirido uma fortuna imensa por meios torpes e vergonhosos”; “Sois um déspota ignóbil porque calcais a decência, as leis, a Constituição e governais só pela bitola do vosso capricho”; “Sois um imbecil, porque a vossa habilidade cifra-se na intriga e o vosso poder só pelo favoritismo”.

Cabral procura reagir, logo modificando a lei da liberdade de imprensa que ficará conhecida como a Lei das Rolhas, seriamente contestada por figuras como Herculano, Garrett, José Estevão de Magalhães ou Latino Coelho. Contra ventos e marés, o Cabralismo vingará desde o início de 1842 a 1846. Com a restauração da Carta, passa a Ministro do Reino. Tenta criar um imposto que o irá liquidar politicamente, sucedem-se as sublevações até que a Revolta da Maria da Fonte marca o termo oficial da primeira fase do Cabralismo. Em 1846, a soberana assume plenos poderes extraordinários, ditadura temporária.

Falando do Cabralismo, Oliveira Martins chamou a Cabral um “Pombal do Constitucionalismo”, um período de direitos individuais suspensos. Vivia-se um tempo de bancarrota iminente, apeado do poder, Cabral vai viver para Madrid. Forma-se o Governo de Palmela, durará pouco.

A Europa, entretanto, vai conhecer um período de grandes conflitos, o mais marcante foram as revoluções de 1848. Costa Cabral regressa ao poder em 1849, se bem que tenha regressado a Portugal em 1847. É execrado, caluniado, odiado pela imprensa e pelos adversários, chamam-lhe “o chibo de Algodres”. Entra em rota de colisão com o mano José Bernardo. Será presidente do Conselho de Ministros de 1849 a abril de 1851, entra em declarado conflito com Saldanha. Maria de Fátima Bonifácio estudou aprofundadamente este período.

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Casa de António Bernardo da Silva Cabral, Fornos de Algodres, pai do 1º Conde e Marquês de Tomar. Pendente a insígnia da ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa

Poderá ter morrido o político, mas nasceu o diplomata, que andou por Espanha, Brasil e a Santa Sé. É plenipotenciário em Espanha, em 1851. Em 1859 foi nomeado ministro plenipotenciário junto do imperador do Brasil, no Rio de Janeiro. E a partir de julho de 1870 é embaixador na Santa Sé onde se cobre de louros.

A investigação de Isabel Banond cobre toda esta progressão política, procura iluminar o pensamento político do estadista e no fundamental o leitor interessado disporá de mais de uma centena de páginas dedicadas à sua oratória na Constituinte, na atividade parlamentar em diferentes períodos e legislaturas, são compilados discursos, tomadas de posição, é inegável a fluidez na sua pronta resposta, como aparecia documentado, sempre habilidoso a replicar aos adversários mais acérrimos, cuidando da linguagem, manipulando com muito à vontade os dossiês desde a Economia e Finanças à Saúde e Educação.

A obra de Isabel Banond para a Assembleia da República forçosamente que ilumina a capacidade oratória de Costa Cabral, atenda-se à natureza do editor (a Assembleia da República), detendo-se muito pouco sobre os prós e contras das calúnias, insinuações e dichotes com que foi votado em vida e depois de desaparecido. Se é verdade que António Bernardo da Costa Cabral tem sido cumulado  por pertinentes trabalhos, continua em falta a biografia do político por inteiro, continua por apurar o que há de legenda negra e de acusações verosímeis daquele que foi um dos mais amados e detestados políticos da monarquia constitucional.

Mário Beja Santos

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