Vila Cardílio teve obras, faz-se entender melhor: Cheia de mistérios, aguarda a sua visita
Por: Mário Beja Santos
Gosto imenso de Vila Cardílio, aquele monumento nacional jacente na estrada municipal de Santo António da Caveira, concelho de Torres Novas. Quando me licenciei em História, descobri rapidamente que estes sinais do passado possuem tanta força com os factos documentais quem encontramos nos arquivos e nos Reservados das bibliotecas. O meu professor de Arqueologia, D. Fernando de Almeida, médico ginecologista de profissão e doutor em Arqueologia, com tese firmada no estudo feito na arte visigótica, mandou-me praticar em estratigrafia no castro eneolítico do Zambujal, Torres Vedras, e em Idanha-a-Velha, na Egitânia, foram férias aprazíveis a medir, a polir, a classificar, a deslumbrar-me com um passado que de soterrado ou em estado ruinoso ganha compreensão e ajuda-nos a compreender a nossa identidade.
É por isso que saio de Tomar e sempre que posso venho contemplar as ruínas romanas de Cardílio, que têm uma história rocambolesca como tantos outros achados arqueológicos. Com efeito, estas ruínas eram exploradas como pedreira. A edilidade de Torres Novas diligenciou para que a arqueologia aqui tivesse uma palavra, veio o coronel Afonso do Paço, em 1963, teve resultados frutuosos nas suas escavações, descobriu um conjunto de alicerces, bases de coluna e pavimentos ornamentados com ‘tesselas’, ficou-se a compreender que se estava num edifício composto por três elementos principais: entrada, peristilo (recinto rodeado de colunas) e exedra (amplo átrio ou pórtico semicircular).
Quem visita Vila Cardílio perde-se de amores pelos mosaicos, aqui predominam os de tranças e entrelaçados, mas a atenção vai para um quadro de aves e para os retratos dos donos da casa, e há uma inscrição latina que se presta a múltiplas interpretações, parece uma charada, os entendidos põem hipóteses, mas estas seis palavras enigmáticas não são consensuais: VIVENTES CARDILIVM ET AVITAM FELIZ TURRE – como tudo são hipóteses dou o meu voto para esta possível tradução: a torre será feliz enquanto viverem Cardílio e Avita. Terão vivido no século IV, no entanto, há construções e espólio recolhido e identificado que apontam para os séculos I e II.
Quando recentemente li que houvera obras de valorização em Vila Cardílio, que se tornara num espaço prazível, permitindo uma leitura mais clara e acessível das ruínas, com quadros interpretativos, alterações na entrada com um espaço de acolhimento e um futuro centro de interpretação, pus-me ao caminho. Visitei a valorização feita, partilho convosco o que há de novo em pedagogia, conforto, mais compreensão e merecido orgulho nestes vestígios da presença romana no Médio Tejo.
Tem aqui o leitor alguns dos motivos para visitar e desfrutar a face lavada das ruínas romanas de Cardílio, está francamente melhorada a compreensão desta presença romana que faz inequivocamente parte de quem somos.
Artigo da autoria de Mário Beja Santos, publicado na edição impressa do Jornal O Templário de 16-11-2023